27.6.14

Coisas que meninas não podem fazer


     Recentemente, li no site Brainstorm9 uma matéria sobre a última campanha publicitária da P&G "Always #LikeAGirl" e já já vou falar sobre ela. Mas antes, vamos bater um papo?

     Eu fiquei pensando quantas vezes na vida, ouvi coisas desse tipo.
Eu nunca gostei de brincar de "coisas de menininha". Eu gostava de andar de bicicleta, de jogar bolinha de gude (tinha coleção), de soltar pipa (tenho cicatriz de linha com cerol nos dedos).
Eu subia em árvores, pulava o muro de casa ao invés de abrir o portão, subia no telhado quando queria ficar sozinha ou me esconder da minha mãe. Chutava a bola no portão quando estava com raiva.
Sim, eu tive bonecas e algumas eu realmente amava (apesar de sempre cortar os cabelos das Barbies), como é o caso das bonecas de porcelana que meu avô trazia da Feira Hippie de Belo Horizonte e das mini bonequinhas (as Fofoletes) que minha avó me dava.
Quando eu era criança,  minha mãe era chamada no colégio toda semana (quiçá todo dia) para ouvir reclamações que eu era muito bagunceira (nunca pra reclamar das notas, btw) e que eu batia nas outras crianças ("quem me bate também apanha"). Não me lembro, nenhuma vez, de ter chegado em casa chorando por causa de algo na escola.
Quando eu era criança, assim como todas nós mulheres, ouvia o tempo todo coisas como "isso não é coisa de menina", "isso é brincadeira de menino", "você devia se comportar que nem uma menininha" ou ainda "você parece um moleque".
Pois sim, E DAÍ? Desde que eu era criança até hoje, nunca entendi qual era o problema de não ser como as outras menininhas e brincar das coisas chatas que elas brincavam. Nunca entendi qual era o problema de jogar bolinha de gude ao invés de brincar de dar comidinha para as bonecas. De preferir um quebra cabeças do que um conjunto de panelinhas de plástico. De querer fazer karatê ao invés de balé (e acabar fazendo natação, mas isso é outra história).


     O que eu vejo nessa geração de meninas (que vai da pré-adolescência até sabe-se-Deus-quando) é que  existe toda uma preocupação com coisas como: maquiagem do dia, unhas do dia, batom novo da marca X, perfume importado da marca Y, bolsas de marca, look do dia (olhem como me vesti hoje), cabelos, roupas caras, sapatos caros, baladas, moda, dieta, ficar magra...
E existe toda uma patota de meninas, blogueiras, disseminando coisas do tipo "dicas para ser mais feminina", "como ter um namorado", como isso e como aquilo blablabla - e zero de princípios, zero de valores.
Aliás, quando falo de "valores", não é sobre o número que vem na etiqueta do que você compra, ok?

     Tem muita gente preocupada em dizer como você deve ser, mas também tem muita gente preocupada em seguir regras de gente que nem conhece.
Minhas queridas leitoras, vou deixar uma dica de como agir quando alguém quiser ditar como você deve ser ou fazer algo:


Deixa eu dizer umas coisinhas pra vocês. Aliás, vou deixar listinha bem básica para vocês refletirem:

• Se você quer emagrecer, que seja para ficar saudável, que seja porque você quer se sentir bem, que seja porque você gosta de exercício, que seja porque você quer se alimentar melhor. Mas repare bem na palavra que mais se repete na frase anterior: você. Que seja por você, amiga, não por imposição de alguém que quer te convencer que você só vai ser feliz, descolada e amada se for magra. isso é mentira! Ok?

• Se você gosta de maquiagem, use maquiagem. Se você não gosta de maquiagem, não use maquiagem!
Não fique por ai dando trela pra quem diz que mulher TEM QUE usar maquiagem, TEM QUE nada!
E se você gosta, não fique por ai dando trela pra quem diz que maquiagem demais é coisa de mulher vulgar, que seu batom vermelho é vulgar. A fuça é sua, pinta ela como você quiser! Ok?

-Ah, e se você gosta de maquiagem, mas não sabe fazer maquiagem, tem um monte de blogs, sites e youtubes de mocinhas que ensinam - e muitas delas são bem bacanas ;)

• Se você quiser comprar aquela bolsa cara, aquele perfume importado, aquela maquiagem top e roupas que custam mais do que valem, você trabalha, se esforça e compra todo tipo de bugiganga que você quiser. E olha, ninguém tem absolutamente nada a ver com o que você faz com o seu dinheiro. Ele é seu, você trabalhou e se quiser fazer uma fogueirinha com ele, o problema é seu.
Só não fica por ai reclamando que parcelou em 100 vezes aquela bolsa da Chanel que você comprou só porque todo blog de moda que você viu disse que você precisava ter uma. Você pode ter e fazer o que quiser - desde que seja realmente o que você quer, não o que querem que você queira.

• Não se leve a sério demais. Não precisa enlouquecer cada vez que você receber uma crítica. Ria mais! Se alguém disser para você algo como "isso não é coisa de menina", ria! Ou mande para aquele lugar, você escolhe. Mas não fique travada nesse lance de se levar a sério, você precisa aprender a rir mais e rir de si mesma (dica bônus). Esquece essa coisa de nhenhenhem, de polidez, de ter que ser educadinha. Esquece a pressão social, esquece esse povo que acha vulgar uma mulher gargalhando na rua. Não se cobre demais, ria mais :)

• Não se faça de vítima. Nunca, nunca e nunca. Isso é muito chato, gente. Não fique dando trela pra esses textos meia boca de "mimimi geração de mulheres criada para ser o que os homens não querem", para com esse papo de mulher encalhada. Para, para e para com esse papo de "os homens não dão valor a nós, mulheres bem resolvidas". Vou te dar uma dica: esse tipo de atitude não é coisa de gente bem resolvida. 
Não fica colocando a culpa em outras pessoas, a gente atrai o que a gente procura - e para que te dêem valor, dê-se valor primeiro. Por favor!
Não fica também nessa defensiva de "eu não sou feliz na minha profissão porque eu fiz o que meus pais queriam e não segui meu sonho". Para com isso, você fez porque você quis, você não é vítima dos seus pais. Se você fez o que eles queriam, o problema é seu, vai lá e faz outra coisa, gente! 

• E por último, e não menos importante (a lista poderia ser imensa): se você não sabe o que quer ou não sabe do que gosta: tudo bem também! Não fique aí se esforçando pra ser o que sua mãe, seu pai, seu namorado, seu chefe, seu irmão ou o que revistas femininas querem que você seja. As vezes a gente leva um tempo para descobrir. E um dia você também vai saber.


     Quando a gente é criança, os adultos sempre nos perguntam o que queremos ser quando crescermos. 
Meu irmão queria ser bombeiro, mecânico e dono de parque de diversões para brincar o dia todo sem ter que pagar. Eu nunca soube, porque minha mãe não se lembra de como eu respondia isso - então acredito que eu não respondia nada. Dos 05 até os 13/14 anos, eu pratiquei natação e adorava nadar, competir e ganhar medalhas. Em algum momento da vida, eu sei que quis ser nadadora profissional e pensava em buscar patrocínio e fazer testes para federação. Depois eu pensava que nadar demais me faria ficar com os ombros muitos largos e não quis ter o corpo igual ao das meninas mais velhas da equipe - e assim desisti de ser nadadora. Eu já quis ser atriz, modelo e trapezista. Eu já quis ter, no minimo umas dez profissões diferentes. Eu nunca soube ao certo o que eu queria fazer da vida, mas sempre soube que não queria ser nada contra a minha própria vontade. Atualmente, exerço duas funções diferentes na vida: um emprego regular que garante meu sustento mensal e meu trabalho com fotografia, que garante meu sustento emocional.
Eu tenho 30 anos e resolvi voltar a estudar. Estou fazendo uma faculdade completamente diferente do que trabalho hoje em dia. E depois de passar muitos anos me culpando por não saber o que queria, descobri que às vezes leva-se tempo para descobrir. Que tudo bem em experimentar coisas que não gosto, porque elas me farão descobrir o que eu realmente quero. Que nada do que digam "mas você tem que blablabla" eu realmente "tenho que blablabla" se eu não quiser e não gostar!
O que mais tem por ai, é textozinho chato, caga regra, tutorial de como devemos ser, agir, falar, nos comportar. MEU OVO!


     Voltando ao que me motivou a escrever esse texto enorme (meu coraçãozinho pra você que leu até aqui).
A tal campanha da P&G, quis propor uma reflexão sobre esse papo de "coisas de menina" ou de ter que fazer coisas "com o uma menina".
Para isso, levaram meninas e meninos de várias idades para um estúdio e pediram para que eles encenassem coisas como: correr como uma menina, lutar ou jogar bola como uma menina.
As adolescentes demostraram como é um esteriótipo.
As meninas mais novas, em sua inocência de criança, agiram como quiseram. (Prestem atenção na menininha de vestido rosa).
Já as adultas, após assistirem toda a audição, foram convidadas a demostrar como seria agir sem pensar em esteriótipos. 
O objetivo da P&G, é acabar com o conceito pejorativo dessa expressão. A Campanha "Always #LikeAGirl" vale um minutinho da sua atenção.

Agora assistam ao vídeo da campanha ou clique aqui para ver no Youtube:


     Essa campanha me fez lembrar de uma outra, que eu vi há algum tempo atrás.
Trata-se de um comercial produzido por uma operadora de telefonia chamada Verizon.
No comercial, a proposta é fazer os pais de meninas a refletirem sobre o modo como estão criando suas filhas. Pequenas atitudes como "não mexa com isso, deixe com seu irmão" ou "não suje seu vestido", podem fazer as meninas perderem o interesse pelas coisas que gostam.
Esse segundo vídeo, mostra EXATAMENTE o que o primeiro tenta combater.
No vídeo, uma menina aparece sendo repreendida por fazer coisas que não são próprias de uma menina. Vemos claramente a menina sendo polida, tosada. O vídeo propõe que os pais incentivem suas filhas a explorar a capacidade que elas tem, serem brilhantes.

O vídeo “Inspire her mind” (“Inspire a mente dela") foi elaborado após o resultado de uma pesquisa que apontou que que 66% das alunas do último ano do Ensino Médio se interessavam por profissões da área de Exatas, mas somente 18% acabam fazendo faculdade nessa área.

Assistam o vídeo ou cliquem aqui para ver no youtube:

Aqui tem uma versão com legenda em português

     Pesquisando sobre o vídeo para colocar aqui, descobri que o "Inspire her Mind" é o segundo vídeo de uma trilogia. O primeiro vídeo chamava-se "The Body Shop" e trazia a mensagem que meninas podem ser "mais do que apenas bonitas". Eu não encontrei esse vídeo, mas durante as buscas, encontrei um canal chamado "Be More Than Beautiful" ("Seja mais do que bonita") que possui três vídeos interessantes e quem tudo a ver com o que estamos falando aqui (clique nos nomes para assistir):


Os vídeos mostram meninas dizendo como vão ser quando crescerem se continuarmos ensinando valores distorcidos a elas. A proposta é levantar a reflexão sobre o modo como estamos criando meninas. Que tipo de coisa estamos ensinando, repetindo e perpetuando?  Vale o clique.


   Queridas leitoras, talvez eu tenha dado voltas e embolado um pouco o que eu queria dizer - sou dessas (mas vocês me amam assim mesmo, né?).
Mas pensem comigo: porque existem tantas baboseiras querendo ditar como vocês devem ser? Já pensaram nisso? Vocês podem ser incríveis se quiserem e é triste que muitas não percebem isso.

E se você tem (ou vier as ter) uma filha, não repita os mesmo erros desses vídeos com ela. Sua filha (e você também) pode ser o que ela quiser, ela pode fazer qualquer coisa sem esse esteriótipo idiota de que existem coisas de meninas e coisas de meninos. Não desestimule sua filha, não diga a ela que "menina não pode isso", "isso é coisa de menino" ou "você vai se sujar / sujar seu vestido". Se ela se sujar, caceta, ela pode tomar um banho, né? Se ela sujar o vestido, você lava ele e pronto, sem sofrimento. Para essas coisas que inventaram super-maquinas-que-lavam-roupas-e-produtos-que-removem-manchas-para-você-não-precisar-esfregar-sujeira.
Quando você pensar em falar para sua filha ou para uma menina qualquer a frase "isso não é coisa de menina", lembre-se que meninas e meninos tem as mesmas capacidades, mas a sociedade sexista acaba determinando que meninos podem fazer determinadas coisas e meninas não podem. 
Isso é bobagem, não repitam isso.

     Espero que eu tenha conseguido levantar uma reflexão saudável com esse post. Espero não ter confundido ou ter embolado demais o que eu quis dizer - é muito tempo sem escrever gente, dêem um descontinho.
Pra encerrar por hoje, eu quero deixar só mais um recado para vocês:


O resto é papo furado pra vender revista!

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Carolina! Na verdade se chama Ana Carolina e não gosta de ser chamada de Ana. Não revela a idade, mas todo mundo diz que aparenta bem menos. Fotógrafa e estudante de Jornalismo. Mudou de área depois de anos insatisfeita com a profissão. Carioca, apaixonante e implicante. Carinha de 8, espírito de 80 anos. Chata, mal humorada e anti-social. Gosta de rimas simples, de frases bobas e é viciada em café. Na vida passada foi um gato tamanha preguiça. Tem mania de ter manias, coleciona coisas inúteis e acha ridículo isso de falar de si mesma em 3º pessoa.

 
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